Sustentabilidade Familiar: Sustentabilidade é um assunto chato?

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Nosso grupo de amigos continua reunido e a conversa sobre a vida vai se alternando entre coisas mais sérias e outras bem mais leves, que descontraem o ambiente e fazem todos rirem e relaxar. É interessante ver como a atenção das pessoas muda em cada caso, a reação que têm quando o assunto atrai sua atenção, ou ao contrário, quando o acham chato e desinteressante. Outro dia, estava conversando com um amigo e ele disse: “sustentabilidade não atrai, não é sexy“. Responda rápido: sustentabilidade é interessante ou faz as pessoas dormirem (mesmo os nossos amigos que não beberam álcool ou comeram demais)?

Ser (atraente) ou não ser, eis a questão

Afinal, o que desperta a atenção das pessoas e as faz se interessarem por alguma coisa? Essa pergunta está, com toda a certeza, na mente de todos o(a)s profissionais de marketing, porque encontrar a resposta para essa pergunta é a chave para terem sucesso nas suas campanhas, vendendo seus produtos ou serviços para a maior quantidade de clientes possível.

A resposta pode ser encontrada ao olharmos a pergunta sob a ótica da mudança que ela pode gerar nos clientes, se for comprada. Na verdade, toda mudança só ocorre quando há desconforto em relação à situação atual e esse desconforto é maior do que o custo a pagar (ou resistência à mudança) para fazer a mudança acontecer. Se for grátis pode ser até que nem precise de um desconforto…

E que desconforto é esse? De modo geral, ele está ligado a alguma coisa que queremos, que temos interesse em conseguir. Pode ser algo mais concreto de que temos necessidade, tal qual alimento, bebida, teto sob a cabeça, por exemplo, ou que desejamos por alguma razão não tão básica assim, como uma roupa nova ou uma viagem para Paris.

É muito possível que seja outra coisa que gere alguma motivação não tão concreta, mas também necessária ou desejada, tal como amor e reconhecimento, ou infelizmente, ódio e vingança. Sendo curto e grosso, mudamos para fugir da dor ou para conseguir prazer.

Dores e prazeres da sustentabilidade

Quando o tema é sustentabilidade, é preciso ir um pouco mais fundo para entender de que desconforto(s) estamos falando e o que faria as pessoas terem necessidade de ou desejo por ela (= terem interesse). Além disso, que pessoas são essas?

Falando das pessoas, temos que saber se elas vêem o tema como profissionais ou como leigos/público em geral. Enquanto profissionais, quer seja a serviço de alguma empresa ou ONG, ou como pesquisadores, consultores ou funcionários de organismos de governo, as pessoas se envolvem com sustentabilidade de uma forma mais direta e é fácil entender que sua motivação vem da própria atividade que exercem. Mas como motivar as demais, que tem interesses difusos pela própria diversidade da vida?

De que desconforto(s) estamos falando para pessoas comuns? O que as faria terem necessidade de ou desejo por sustentabilidade?

Acreditamos que grande parte da razão pela qual o interesse seja coisa para poucos decorra de quatro grandes dificuldades, apresentadas na tabela.

DesafioEncaminhamento Racional
A palavra sustentabilidade transformou-se em sinônimo de cuidado com o meio ambiente. Essa visão dificulta a percepção de que muitas outras áreas e disciplinas mantém relação importante com os objetivos que se buscam quando se procura sustentar algo. Além disso, ela tem sido usada frequentemente em situações de conflito, como uma disputa entre o bem, representado pelos que defendem a Natureza, e o mal, representado por empresas e outros que são vistos como os que a destroem para enriquecer. Explicar que meio ambiente, embora seja uma parte importante da discussão sobre sustentabilidade, é apenas uma das suas dimensões, e não se trata de uma questão de “mocinhos e bandidos”.
Os assuntos normalmente tratados são muito complexos e demandam visão sistêmica das coisas, pois envolvem um amplo leque de aspectos diferentes, em uma infinidade de áreas e disciplinas técnicas e científicas com altos graus de sofisticação.Encontrar diferentes formas de explicar e mostrar cada assunto e suas relações com os demais de forma mais simples, usando linguagem apropriada para o público que pretendemos atingir.
Os assuntos são normalmente tratados em instâncias altas nos governos e em grandes empresas, gerando uma ideia de que estão fora do alcance das pessoas comuns, que não percebem a relação entre seu dia a dia e o que está sendo decidido em nome delas, muito embora sejam elas as que acabam por “pagar a conta”.Trazer a apresentação e discussão dos temas para alcance das pessoas, mostrando sua relação direta com aspectos relevantes do seu dia a dia, e como elas podem fazer diferença com as suas escolhas e decisões.
A maior parte das pessoas tende a perceber a vida e as suas mudanças em prazos curtos, quando muito vê alguns anos à frente, devido ao estado de mudança permanente que a sociedade moderna criou. Essa visão dificulta o entendimento de temas que envolvam prazos mais longos, multigeracionais até, exatamente os ligados com sustentar alguma coisa por um prazo indefinido, que é a definição da palavra sustentabilidade.Fortalecer a visão de longo prazo nas pessoas, ajudando-as a planejar melhor suas vidas e de suas famílias.

Como você pode ver, os quatro desafios são extremamente difíceis de tratar devido às suas características e abrangência. Você provavelmente considerou as propostas de encaminhamento racionais e lógicas. Mas, lhe pergunto, é suficiente explicar o problema para realmente motivar as pessoas a mudarem sua percepção e, mais importante, mudarem sua postura e passarem a agir mais sustentavelmente?

Infelizmente, a resposta é não… Apesar de racionais e lógicas, elas são exatamente e apenas isso: racionais e lógicas. Funcionariam em um ambiente econômico clássico, dominado por pessoas que tomam suas decisões de forma racional, buscando maximizar os resultados de suas decisões. Mas, na realidade, o que mais motiva pessoas a mudar não são fatores racionais, mas sim emocionais. Lembre-se bem daquilo que mais quis na vida, ou daquelas que ainda quer. O que lhe fez ou faz querer foi definido pelo seu cérebro ou por seu coração? São decisões predominantemente racionais ou emocionais?

Na maioria esmagadora das pessoas, os aspectos emocionais predominam. Dito isso, é preciso encontrá-los para que se consiga identificar os incômodos, as dores, os principais motivos que farão com que pessoas comuns se interessem por assuntos (aparentemente) tão áridos, complicados, distantes e desinteressantes como sustentabilidade. O que estimularia nossos amigos a discutirem sustentabilidade com grande interesse, enquanto estamos reunidos e nos divertindo? Talvez, quem sabe, devamos esperar até que a comida comece a faltar e a bebida a fazer efeito?

O Autor

Marcelo Kós Silveira Campos

É um profissional com mais de 30 anos de experiência em temas ligados à sustentabilidade, dos quais mais de 20 trabalhando com a indústria química. Atuou no desenvolvimento de normas, sistemas e iniciativas para a gestão de saúde, segurança, meio ambiente, responsabilidade social e comunicação em empresas e organizações brasileiras e internacionais.

É engenheiro químico pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e mestrando em Desenvolvimento Sustentável na Universidade de Utrecht, na Holanda.

É o CEO da FASUS.

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